segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Warloghe - Three Angled Void


Nos obscuros confins do Black Metal, onde a simplicidade é enaltecida e a sofisticação técnica é rejeitada, encontra-se o terreno fértil de autenticidade. ''Warloghe'', com seu terceiro álbum, "Three Angled Void," lançado pela gravadora Northern Heritage Records, emerge como um mestre nessa paisagem desolada, onde inúmeros ousam, mas poucos conquistam.
 O Black Metal é a linguagem da escuridão e do sofrimento, uma expressão artística que se destaca pela falta de pretensão e busca da pura essência. "Three Angled Void" é um cálice envenenado de autenticidade que nos lembra o que é esquecido. Em um mundo inundado de mediocridade disfarçada de Black Metal, o Warloghe permanece como uma lufada de ar fresco, uma rara pérola negra em um oceano de imitação barata.
A produção do álbum é propositalmente obscura, ecoando a essência do gênero. Dentro das seis faixas que compõem a obra, há uma riqueza surpreendente. Desde o lamento introspectivo e melancólico de "Inhuman Mirror," escrito entre 2003 e 2007, à fúria comparativa e alta energia de "Invultuations from the Black Earth," o qual também faz parte do material escrito na mesma época, o álbum desvela facetas sombrias profundas e diversificadas.
Eorl Torht Tyrannus, o mestre de cerimônias dessas invocações, nos agracia com seu grito diabólico e atormentado. As guitarras, febris e enlouquecidas, cortam como navalhas, enquanto o caos é amplificado pelo martelar dos tambores em segundo plano, a cargo de Arkkon Vulpekul. 
A produção crua evoca uma aura de mistério, mantendo os detalhes à distância, como sombras evasivas nas trevas. 
A faixa "Singularities Descend," que em parte foi escrita em 2021, adiciona um toque contemporâneo a essa jornada às raízes do Black Metal. "Three Angled Void," gravado em maio de 2021, mantém-se firme, desbravando o caminho da mão esquerda. Esta obra é um retorno às trevas primordiais, uma jornada às origens do Black Metal, onde a autenticidade não é um mito, mas uma realidade assombrosa.
 
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Quanto às letras, permita-me destacar a profunda escuridão que permeia cada palavra. Estes versos, imersos nas sombras mais profundas, ressoam como lamentos sinistros e imortais. 
 
 
Na  primeira faixa "The Everburning," somos guiados por um caminho sombrio, onde o silêncio iminente não prenuncia apenas o rompimento, mas também a decadência e a obediência imposta.
É como se os ventos da morte soprassem, e as cinzas brancas, como um testemunho funesto, caíssem dos céus à medida que o Abismo Aberto se revela. Um lugar de conhecimento profundo, onde os sonhos negros se banquetam com sabedoria sombria.
Sob a terra, nas profundezas da cova terrena, o queimor eterno e insuportável reside, invisível aos olhos, mas sentimos sua presença. Uma única lâmina de grama se inclina diante dos ventos da morte, e se a terra for envenenada, nunca mais se erguerá.
As imagens pintadas por essas palavras evocam vales e desfiladeiros infestados de moscas, em um crescendo de escuridão que nada pode igualar. O Abismo Aberto se revela, trazendo consigo uma loucura indomável, onde a surdez não oferece alívio, a cegueira não é solução, e a morte não traz salvação.
Esta é uma odisseia à glória da morte, uma exploração profunda no cerne do desconhecido, onde a linguagem obscura é o guia e a música é a trilha sonora que ecoa na mente dos ouvintes.

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Nas palavras sombrias da faixa "Lucifer Ascends", somos convidados a contemplar a ruptura do espaço, onde o tecido da realidade se desfaz. Nesse abismo, a escuridão mais profunda se desenha, e a mente se depara com um poder imenso dedicado à destruição absoluta.
Essas palavras nos transportam para dimensões paralelas, onde pesadelos ganham vida. São reinos de física reversa e alterada, formas invisíveis e criaturas com chifres que se regozijam na aniquilação. Imagine montanhas titânicas, esferas de prata e a sensação do fluxo de poderes desequilibrantes.
Em um trono esculpido na forma de uma espiral ameaçadora, um ser se ergue. Em suas mãos, segura um estandarte e um cetro pálidos, ambos destoando em aparência da sinistra representação de seus olhos. Suas asas se estendem sobre o trono, um guardião vigilante, pronto para agir.
Aqui, nas entrelinhas, podemos vislumbrar a ascensão de Lúcifer, a personificação da rebelião e da busca por poder. Este ser abraça o vazio, encanta-se com a destruição e evoca a existência das trevas. A imaginação não pode ser limitada, mas o desejo por esse ascenso é intenso e avassalador.
A cada estrofe, somos imersos em uma visão sombria e abissal, onde o poder e a destruição se entrelaçam, criando uma narrativa repleta de imagens grandiosas e aterradoras. É como se fôssemos convidados a contemplar a ascensão de um ser que desafia a própria ordem cósmica, um retrato perturbador de desejo e rebelião contra os limites impostos pela realidade

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Nas palavras da canção "Inhuman Mirror", mergulhamos em uma visão sombria e enigmática, como se olhássemos para um espelho de outro mundo. A superfície líquida reflete um negrume profundo, onde apenas uma única luz aponta o caminho, afastando a escuridão.
Essa visão desolada nos leva a um planalto cinzento e desolado, atravessado por sete luzes que lutam contra a chegada iminente das trevas. Um sentimento de frieza penetra as profundezas de uma sepultura aquática, e a fraca luz penetra o que a escuridão cria.
Nesse espaço, nada se move, nada emana calor, emoção ou luz. Parece que estamos diante de um monólito negro que repousa nas profundezas da terra, imóvel e imperturbável.
A letra nos conduz por uma jornada através das eras, para além do véu da existência, em direção à morte profunda e ao eterno negro. Nesse ponto, o espelho inumano revela que nada reflete, apenas queima como mil estrelas. É como se a sabedoria e o conhecimento escorressem de todos os poros, e a própria essência se exalasse em luz estelar.
Essa música nos mergulha em um estado de contemplação de um espelho que não reflete nossa imagem, mas sim as profundezas do desconhecido. É um poema à escuridão, à inumanidade e à transcendência para um reino além de qualquer compreensão. Cada verso nos leva mais fundo nesse abismo, onde a escuridão e a luz se fundem, e a realidade se dissolve em mistério.

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 Nas palavras de "Invultuations from the Black Earth", somos transportados para um cenário macabro e transcendental. A imagem de fluidos escorrendo ao longo da espinha evoca uma sensação sinistra e ritualística.
Um cálice com mandíbulas dilaceradas serve como um canal para esses fluidos que surgem da Terra Negra. Esta entidade é descrita como nem viva nem morta, uma construção que não pode ser atribuída a mãos humanas.
Os ventos lamentam através de formas distorcidas enquanto a luz acinzentada do outono se reflete em ossos polidos. O sangue derramado sobre o linho branco seca e cria um contraste sombrio. Um círculo de pálidos seres murmura e rangem lentamente, enquanto uma floresta negra serve de cenário estético.
Entidades sem rosto emergem através do Olho Aberto, apinhado de serpentes sem face. Elas falam através da Boca Aberta, que se rasga nas costuras.
Essas palavras evocam uma imagem de um ritual sombrio e sinistro, onde forças ocultas se manifestam através de símbolos e entidades estranhas. O ambiente é descrito de forma a transmitir uma sensação de horror e fascinação, onde os limites entre o real e o sobrenatural se tornam turvos. A natureza do ritual e o propósito dessas entidades permanecem obscuros, deixando-nos com uma sensação de mistério e apreensão.
 
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 A faixa "Starlit Portals Amidst Mass Graves" traz uma narrativa sombria e intensa que mergulha nas profundezas da morte e do desconhecido. Os versos pintam um quadro vívido de um cenário macabro, onde sepulturas negras convocam todos à sua inevitável conclusão.
A atmosfera criada evoca uma sensação de abismo, onde a vida encontra seu fim. As sepulturas se estendem pela paisagem como um testemunho sombrio do destino final de todos os seres vivos. A visão de estrelas embutidas em cada túmulo sugere uma conexão misteriosa entre o céu e a terra, entre o mundo dos vivos e dos mortos.
A profundidade das sepulturas é tão profunda que aqueles que ousam encará-la são cegados pela visão do abismo e pela iminência da morte. No entanto, essa cegueira é descrita como um renascimento nas trevas, onde se encontra uma iluminação sinistra e uma nova perspectiva. É uma jornada em direção à transcendência, onde os olhos humanos são consumidos e substituídos por uma compreensão incompreensível.
A faixa também faz referência a uma entidade que existe além deste mundo, algo que não é deste mundo, que se ergue a partir da obscuridade eterna. Esse ser é "manchado para sempre pelo rasgo oculto", uma referência ao inevitável encontro com o desconhecido e a transformação que ocorre.
A ideia de portais espinhais que se alinham e a promessa de um "súbito rugido glorificado" sugerem um trânsito em direção ao desconhecido, um despertar transcendental. Esses versos finais ressoam com a ideia de uma ascensão às estrelas, uma jornada para além da mortalidade e em direção à imensidão do universo, onde o indivíduo se torna parte de algo maior.
"Starlit Portals Amidst Mass Graves" é uma obra de poesia negra que mergulha profundamente nas complexidades da mortalidade, transcendência e na conexão entre vida e morte. Ela desafia o ouvinte a refletir sobre o mistério da existência e o destino final de todos nós.
 
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"Singularities Descend" é a última faixa que transcende os limites da compreensão humana e mergulha nas profundezas do desconhecido. Os versos iniciais ecoam com a essência da imaginação e do sonho, abrindo portas para realidades que nunca existiram, para aquilo que foi perdido no tempo e o que está por vir.
O eu lírico expressa o desejo de sonhar com línguas desconhecidas e visões perturbadoras, como espirais formadas por mãos decepadas. Essas visões o guiam em direção à aurora, sugerindo uma jornada em direção à iluminação ou ao despertar espiritual.
A referência a Syth Ommot, cujo voo retrocede ao início, evoca a ideia de ciclos eternos e a observação de mistérios inacessíveis para o homem comum. A queda das singularidades e a ascensão de Lúcifer insinuam uma conexão entre o divino e o desconhecido.
A faixa encerra com o enigmático "quando Lúcifer ascende, singularidades descendem", sugerindo que a ascensão de Lúcifer está intrinsecamente ligada ao enigma das singularidades, deixando o ouvinte com uma sensação de mistério e maravilha.

Essas letras exploram temas de transcendência, sonhos, visões perturbadoras e o inexplicável, criando uma narrativa que desafia a compreensão convencional.



 
 
 
Banda(s) / Band(s): Warloghe
Álbum / Album: Three Angled Void
Ano / Year: 2021
Tipo / Type: Full-length
Rótulo / Label: Northern Heritage Records
Gênero(s) / Genre(s): Black Metal
Tema(s) lírico / Lyrical theme(s): Satanism, Death worship, Darkness
País / Country: Finland


All music written between 2003 and 2007.
Singularities Descend partly written in 2021.

All lyrics written between 2003 and 2016.
Three Angled Void recorded in May 2021.


Tracklist:
1. The Everburning 06:42
2. Lucifer Ascends 04:44
3. Inhuman Mirror 05:07
4. Invultuations from the Black Earth 04:09
5. Starlit Portals Amidst Mass Graves 06:05
6. Singularities Descend 06:36
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Total playing time: 33:23


mp3@CBR320kbps + Covers
 

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